Práticas de Leitura: Museu da Paisagem convida Álvaro Domingues
13 Março
domingo 16h
Sala Manuela Porto
Duração 2h
O TBA fica junto ao Largo do Rato.
Condições de acesso
- À entrada do espaço, poderá ser medida a temperatura sem registo, enquanto a medida for recomendada pelas autoridades de saúde. O uso de máscara é obrigatório antes, durante e depois da sessão.
- Solicitamos que desinfete as mãos à entrada e adote as medidas de etiqueta respiratória.
- Mantenha uma distância de segurança e evite o aglomerar de pessoas.
- Traga o seu bilhete de casa ou, caso tenha mesmo de comprar o bilhete na nossa bilheteira, escolha o pagamento contactless por cartão de débito ou MBway.
- Nas entradas e saídas, siga as recomendações da equipa do TBA.
- Devido às indicações da Direção-Geral de Saúde, não é possível entrar na sala após o início da sessão ou alterar o seu lugar após indicação do mesmo pela Frente de Sala.
Álvaro Domingues é geógrafo e professor na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. Para além das suas funções de docente e investigador do Centro de Estudos de Arquitetura e Urbanismo da FAUP, publica com regularidade sobre temáticas relacionadas com a geografia urbana, o urbanismo e a paisagem.
João Abreu é designer, professor e investigador na Escola Superior de Comunicação Social. Desde 1998, trabalha os temas da comunicação nos museus, património e paisagem. Participa regularmente, como investigador, autor, curador e editor, em conferências, exposições e publicações dedicadas ao registo e comunicação de paisagem. É fundador e membro da equipa do Museu da Paisagem.
Como nasceu o Museu da Paisagem? Porquê?
O Museu da Paisagem resulta de um projeto de investigação de uma equipa da Escola Superior de Comunicação Social do Politécnico de Lisboa. É em grande medida um projeto de comunicação que procura dar o seu contributo para a formação de uma cidadania paisagística. Ou seja, despertar o sentido crítico e participativo de todos os cidadãos para as questões da paisagem. Acreditamos que se houver uma maior literacia e consciência do papel de cada indivíduo na transformação da paisagem será possível promover paisagens mais saudáveis. Paisagens vivas e equilibradas nas suas diferentes dimensões: ambiental, social, económica e cultural.
O Museu da Paisagem é um museu com sede digital e entende a paisagem como resultado de um processo dinâmico, de uma interação permanente entre o ser humano e a natureza, entre uma sociedade e o seu território e pretende, por isso, ser um agente ativo nessa transformação, promotor de paisagens vivas e saudáveis.
Quais os vossos principais projetos? E parcerias?
Criar um Museu da Paisagem é um desafio enorme. Desde logo pela impossibilidade de se colocar a paisagem num edifício, para ser exposta e visitada como num museu tradicional. Por outro lado, a paisagem resulta de um sistema vivo, de uma interação permanente entre fatores humanos e naturais, não sendo por isso estática e estando em permanente transformação. Simultaneamente, há ainda as questões da perceção, porque a paisagem também depende do modo como a apreendemos, havendo por isso tantas paisagens como o número de pessoas que as leem.
Perante esta equação tão difícil de resolver, os nossos projetos têm-se concentrado em dois grandes objetivos: criar ferramentas de leituras de paisagem e promover a reflexão e expressão artística dedicados aos temas da paisagem e do território. Assim, desde que o Museu da Paisagem abriu ao público, em abril de 2019, destacaríamos três projetos:
- O projeto Narrativas e Experiência do Lugar, que foi desenvolvido ao longo do território do rio Tejo (em espaço português), em parceria com os Politécnicos de Lisboa, Santarém e Castelo Branco e a empresa STRIX. Deste projeto resultaram várias exposições, conferências, workshops e um livro-guia de leitura e interpretação da paisagem do Território Tejo. Foi o primeiro projeto do MdP, um importante “espaço” de experimentação que, de certa forma, terá sido o “motor de arranque” para todo o trabalho realizado desde então;
- O projeto O que há neste lugar?, onde desenvolvemos um livro de introdução à leitura e exploração da paisagem e um conjunto de oficinas para o nosso serviço educativo. Estas oficinas e o livro O que há neste lugar?, de Maria Manuel Pedrosa e Joana Estrela, desafiam-nos a ler o espaço à nossa volta, a detetar pormenores, a sentir o invisível. Propõem atividades para explorar o que cada lugar tem de especial, mas também o que pode ser melhorado, “porque tão importante como observar a paisagem é saber tratar dela. Afinal, é a nossa primeira casa”;
- O projeto editorial Portugal 15-5-20, reflexões sobre o país e a condição de viajante, realizado com o fotógrafo Duarte Belo, do qual resultou a realização de três viagens e a publicação de três livros: Caminhar Oblíquo, Depois da Estrada e Viagem Maior. As linhas de viagem destes três itinerários percorridos mostram-nos o recorte de um país inteiro, uma aproximação à representação do espaço português. “Era esta realidade que procurávamos. Deixa de haver uma linha para nos ser devolvida a fronteira, os limites de uma cultura. Era esse o objetivo desta trilogia. Encontrar, em três viagens, um país que se pode observar de diferentes pontos de vista, que se complementam, que se entretecem”.
Todos os projetos do Museu da Paisagem têm sido desenvolvidos em parceria com várias entidades, artistas e investigadores. Acreditamos que a criação de uma “paisagem em rede” é a melhor maneira de cumprir a missão do MdP.
Têm atividades regulares?
As atividades realizadas pelo Museu da Paisagem estão normalmente associadas a cada um dos projetos desenvolvidos, não existindo um programa regular. Contudo, desde a sua abertura, tem havido uma atividade contínua com exposições, edição de livros, conferências e oficinas.
Não sendo muito fácil aumentar a regularidade das atividades do MdP, tendo em conta os recursos e equipa do museu, estamos a preparar um kit com instruções para a realização de oficinas de leitura e exploração de paisagem. Este modelo “faça você mesmo” tornará possível chegar a mais pessoas através de parceiros, que de forma autónoma possam organizar as suas próprias oficinas.
Como apareceu o livro e a exposição Paisagens Trangénicas?
Há muito que seguimos o trabalho do Álvaro Domingues. Os seus livros A rua da estrada, Vida no campo e Volta a Portugal são referências incontornáveis para quem estuda e se interessa pelos temas da paisagem.
O primeiro encontro com o Álvaro foi na conferência de apresentação pública do Museu da Paisagem, na Escola Superior de Comunicação Social, em abril de 2019. Para a equipa do MdP esta presença foi muito importante, porque o modo como lê e dá a conhecer a paisagem desconstrói uma série de estereótipos instituídos. Essa abordagem tem uma grande relação com a literacia e a cidadania paisagística que procuramos no museu. Por isso, diria que este novo encontro com o Álvaro Domingues seria inevitável. Em 2021 surgiu a oportunidade de desenvolver em parceria com a Ci.CLO, no âmbito da Bienal’21 Fotografia do Porto, o livro “Paisagens Transgénicas” e um conjunto de três exposições. Duas dessas exposições aconteceram na cidade do Porto, durante o programa da Bienal, e uma terceira, em versão digital, pode ainda ser visitada no site do Museu da Paisagem. O livro é o elemento mais perene deste projeto e, de certa forma, funciona como memória e continuação das várias exposições.
O que são paisagens transgénicas?
Diria que a leitura do livro será a melhor forma de encontrar a resposta para esta pergunta. Mas importará acrescentar que a designação “paisagens transgénicas”, que entretanto começa a ser de uso comum entre os especialistas da paisagem, é uma inovação do Álvaro Domingues, que trouxe para o centro do debate o carácter híbrido da paisagem que não se coaduna com uma visão compartimentada em tipologias distintas. Tal como se apresenta na sinopse do livro, “Paisagens transgénicas interroga o sentido da paisagem enquanto código de reconhecimento do território, propondo a transferência do conceito biológico de organismo geneticamente modificado, expondo assim a natureza compósita dos elementos de que a paisagem se faz, as suas diferentes origens, linhagens, o modo como se associam em corpos distintos, instáveis, cruzados. Deslocada da ordem “natural” das coisas, a paisagem transforma-se num dispositivo estético e político que interroga a mudança e também as inquietações de quem olha e atribui sentidos vários e dissonantes sobre o modo como vemos o mundo.”
Este trabalho sobre a paisagem não se atém, necessariamente, às fronteiras nacionais: de que modo o foco na paisagem dá a ver um território desde já sempre atravessado por fluxos globais e tensões regionais, ainda que circunscrito por fronteiras nacionais?
Neste momento a paisagem é um fenómeno completamente global pelo simples facto de consumirmos produtos e matérias-primas de todas as regiões do planeta. Ou seja, a nossa paisagem não é apenas aquela que habitamos. O conceito de cidadania paisagística passa em grande medida por aqui. O modo como consumimos pode transformar a paisagem em diferentes sentidos e dessas diferentes paisagens estarão associadas diferentes realidades sociais. As monoculturas são mais eficientes de um ponto de vista económico, mas muito pouco interessantes do ponto de vista ecológico. As várias dimensões de uma paisagem devem coexistir numa tensão equilibrada e cada indivíduo pode contribuir com a sua quota parte para esse equilíbrio. No Museu da Paisagem procuramos trazer alguns destes temas para o debate.
Projetos para o futuro?
Temos vários projetos em curso e outros que gostaríamos muito de vir a realizar. O registo da paisagem através do desenho é uma dimensão de leitura e expressão que nos interessa muito e neste momento estamos a desenvolver dois projetos em parceria, que esperamos apresentar ainda este ano, onde o desenho é o grande protagonista. Temos também o desejo de um dia organizar um grande evento aberto a todos os públicos de leitura e registo de paisagem. Uma espécie de festival em que se faria de modo participativo um grande retrato do país e da sua paisagem.
Práticas de Leitura são encontros de regularidade incerta em torno de publicações entusiasmantes porque urgentes, interessantes, desarmantes ou prementes, autoeditadas ou não. Nestes encontros, trata-se de ler e conversar sobre o que se lê. Alguns encontros contam com a presença de quem escreveu e editou. Neste encontro, com a presença da equipa do Museu da Paisagem e do geógrafo Álvaro Domingues, o significado da palavra leitura estende-se ao território e à paisagem. São tantos os caminhos que se abrem perante os desafios de um Museu da Paisagem que a sua concretização terá tanto de fascinante como de inquietante. A simples junção das palavras “museu” e “paisagem” é suficiente para desencadear uma complexa teia de pensamentos, relações e contradições.
O Museu da Paisagem é um museu online dedicado à paisagem. Com início em maio de 2015, resulta de um projeto de investigação de uma equipa multidisciplinar de investigadores, professores e estudantes da Escola Superior de Comunicação Social do Politécnico de Lisboa. Em 2019, constituiu-se como associação, tendo uma programação regular com exposições, conferências, oficinas e edição de livros.